O EMOCIONAL NOS TEMPOS DO COVID
Precisamos nos ater a uma questão essencial, a saúde mental. E isso implica uma atenção reforçada aos desconfortos emocionais promovidos nesse período e por causa dele. Não é desejável que desordens e transtornos psíquicos atuem negativamente sobre nosso organismo, sobre o sistema imunológico, enfraquecendo-o, quando mais precisamos dele.
E alguma prevenção psicológica é sempre bem-vinda. Infelizmente, a neurose (neuras, estresses, pensamentos negativos e repetitivos) está em alta nesse momento, nesses tempos difíceis da pandemia, e por causa desta. Sem mencionar, que o desespero sobe ao palco com um público invejável, fazendo vítimas em todos os círculos sociais.
Mas o que acontece? Na psique, invariavelmente, a primeira coisa que surge é o negativo, seja esse negativo motivado por fatos concretos, probabilísticos ou fantasiosos. Resultando em medo, aflição, angústia, pessimismo, ansiedade, depressão e etc.
Outro ponto relevante, e como tudo mais na existência, a energia psíquica tem que ser bem direcionada, ou seja, exige suor, esforço para sua melhor acomodação e utilização. Não se pode deixar tal instância à vontade, como se diz, a sua própria sorte. Por isso, dependendo do entorno, certos eventos e acontecimentos vão se consolidando no nosso interior e fazendo estragos na saúde psíquica, inconscientes que sejam, exigindo mais de nós em termos de atuação e cuidados.
E ainda que o sujeito bravamente dê conta da realidade inicial, denegando os primeiros assédios da falácia mental (pois a Mente mente), tipo “eu vou pegar a doença, eu vou sufocar, eu vou morrer, meu entes queridos irão morrer, o mundo acabou, a quarentena vai me matar, os paciente vão me infectar, muita gente já morreu, só tem gente morrendo, as notícias são terríveis, é o fim do mundo”. São pensamentos negativos (repetitivos, neuróticos), ainda mais que existe um reforço coletivo das más notícias.
Assim, na continuidade dos acontecimentos, esses conteúdos negativos, vindo a ultrapassar a primeira barreira de oposição, ou ainda, surgindo de certos inferninhos do recalque “infectam” o indivíduo com o medo (entre outras mazelas) e pode levá-lo ao pânico. O interessante aqui é que muitos indivíduos ainda assim são atraídos, de maneira quase inexorável, para a barbárie mental e emocional, por essas notícias de baixo calão, aquelas que só alimentam a neurose (Só Freud explica! Bem, sugiro que deixemos o pobre analista descansar um pouco. E também não é do nosso desejo fazer um tratado sobre isso. Apenas saibam que está longe de ser incomum esse fenômeno).
Os saudáveis alimentos, e, estes balanceados, sabemos bem, nutrem adequadamente um organismo e mantêm a intrincada regulação e equilíbrio nutricional sobre as células, tecidos e órgãos. E o contrário segue o mesmo princípio. Não há como discordar disso. A psique necessita de “bons alimentos” também. Além disso, há de se ter uma disciplina e exercícios mentais no sentido do fortalecimento psicológico.
No Budismo existe a figura de Mara, que é uma espécie de demônio da ilusão, o qual Buda, em seu processo de iluminação teve que vencer para chegar ao nirvana. Nesta tradição, cada um tem um pequeno Mara dentro de si, que além de fixar o mundo como real ou de maior realidade, ainda tem o passatempo de atazanar nossa mente com ofertas de todos os tipos, e algumas muito duvidosas e perniciosas.
Mas vejam vocês, não foram poucas as senhoras e senhorinhas que atendi nessa vida clínica em psicologia. E inúmeras vezes, sem muitas opções em termos de estratégias de entretenimento, afazeres e trabalho mesmo para elas, como uma forma de ocupar a mente e uma fonte de higiene mental para poder ajudar a própria terapia. Até porque o trabalho é ordenador da psique. Tive que estender o campo de atuação prática.
Um dia, perambulando por um desses abismos da falta de opção, indaguei a uma paciente se ela rezava o terço, imaginem só, pelo que se tinha revelado bastante católica ( e somente por isso). Disse-me que não o fazia mais. Um costume “bom” que havia se perdido. “Faça-o”, retruquei. Então, com essa estratégia ela se livrou completamente da insônia e das preocupações noturnas, bem como, de seus malefícios diurnos.
O “orai” e o “vigiai” em ação, sabedoria antiga. Em termos psicológicos, imaginem aí, uma oração como o Pai Nosso ou a Ave Maria, não importa, e não importava também de qual religião fosse ou o tipo de oração, sendo verbalizada, sei lá, sessenta vezes. Primeiro que remete o sujeito a algo poderoso, ao mesmo tempo, que ocupa a mente aflita. Troca pensamento, a qualidade deste e ocupa o tempo, afastando qualquer neurose de sua vida. Fortalece a psique.
Essa simples estratégia já livrou pessoas de medicações e aumentou a qualidade do sono e da vida delas. O que deixou alguns religiosos serelepes com essa perspectiva (sacerdotes paroquianos próximos de onde atendia). Embora não seja uma panaceia evidentemente, pois para outras não teve qualquer efeito. Claro, fiz o relato para ilustrar, um exemplo, como se pode disciplinar a mente, educá-la. Ponto que devo dizer, nossa mente é muito mal-educada. E nosso desejo pior ainda.
A psicanálise apregoa que devemos “educar” o desejo, pois é sem limites. E com as desventuras da mente não é diferente. Educamos nossas crianças, pois bem, e isso não deve parecer só uma coisa boa, mas o é de fato fundamental. Precisamos exercer sobre a mente uma certa autoridade, senão ela desgoverna, estilo, “menino (mente) não se governa!”. No campo emocional é mais ou menos o mesmo princípio, conduzindo aí com um viés de acolhimento. Embora deva ser sempre uma dor saindo.
Na mitologia Nórdica, o deus Loki, representa essa entidade, a mente, por isso, tanto pode servir ao mal como ao bem. E é notório que cada um tem que buscar o modo mais adequado para essa pedagogia obrigatória. A lista é enorme, meditação, Yôga, jogos, esporte, exercícios, espiritualidade, leituras, música, estudo (sim, exatamente isso, estudar) entre outras. E também, diga-se, uma oportunidade de descobrir novas coisas. Não podemos nos resumir a seres “de pernas de mesa de bar”, rasteiros, sem nos alimentarmos dos valores maiores da cultura.
Aprecio muito o termo homeostase, acho-o tão bonitinho, “É a propriedade de um sistema aberto, especialmente dos seres vivos, de regular o seu ambiente interno, de modo a manter uma condição estável mediante múltiplos ajustes de equilíbrio dinâmico, controlados por mecanismos de regulação inter-relacionados”. E gosto mais ainda de trazer para o âmbito psíquico, pois é isso mesmo.
O tempo todo estamos na lida com as estruturas psíquicas, complexos de toda ordem, com diversas questões internas e externas, pretéritas, presentes e futuras. Não é fácil, mas necessário cultivar a estabilidade para não gerar sofrimento desnecessário. E mais, que tal atitude possa nos levar a um crescimento pessoal, pois a vida não é estática, e haverá sempre novos desafios a serem enfrentados.
No fundo, devemos aprender a ir mais longe, nesses caminhos da vida, fazer uma crítica mínima sobre a realidade das ideias apresentadas, conceitos, preconceitos, situações. Somos bombardeados por uma série de informações e contrainformações o tempo todo. Eis aí um poço envenenado e de pouca utilidade. Mantermos firmes em nossas atitudes, ações e termos fé (e fé aqui quero dizer, sobretudo, confiança, não apenas em matéria religiosa) essa é uma saída que se pode construir.
De outro lado, existe uma concepção de uma postura positiva a todo custo, a toda a prova (o que se nomeia de positividade tóxica, que termina por frear ações necessárias na realidade). Sendo essa perspectiva completamente irreal, sem lastro, que necessita de ação, cuidado e atenção. Da mesma forma, pode se dizer do que se faz com a esperança. Nunca foi tão massacrada e mal compreendida.
Assim, o mundo não vai acabar e as pessoas não vão desaparecer da face da Terra! Isto não significa que não possa haver uma tragédia. Sim pode. Existem dados epidemiológicos nesse sentido há bastante tempo por sinal. Porém muito depende de nossa conduta enquanto sociedade organizada e mesmo, individualmente. Além disso, devemos compreender que sempre pode surgir uma terapêutica medicamentosa que seja eficiente e suficiente para quebrar o ciclo impostos por novos vírus e doenças.
O que é plenamente factível, pois há muitos profissionais trabalhando nisso, no mundo todo, e, no mesmo ritmo, testa-se inúmeras medicações e as suas combinações. Não é a cura muitas vezes, e uma vacina demora para chegar de fato. E não tenho dúvida que esse momento será importante para terapêutica de outras patologias, e mesmo talvez, como experiências para outras pandemias, que poderiam ser até piores.
Somos seres com grande capacidade de aprendizado e de replicação desses mesmos aprendizados e conhecimentos. O problema do humano é sobre seu próprio humanismo, é sobre si mesmo, seu interno e seu autoconhecimento, andamos a passos lentos nesse sentido. Como uma vez disse Carl Jung, ainda vivemos na barbárie. Já em nossa lida comum, percebam há muita gente amedrontada, outras completamente negligentes.
Embora se pudesse dar ênfase em notícias de superação, de melhora, restauração, restabelecimento após o Cocó (apelido para diminuir a “força” bicho) que são a maioria absoluta, por sinal, e não são muito veiculadas. E se fosse anunciados esses casos na proporção que aparecem, não teria espaço para as notícias ruins. Tal fato teria dois efeitos, o primeiro, não parecia algo sério ou relevante. E É GRAVE a situação dessa pandemia.
Segundo, haveria de imediato uma falta de compromisso das pessoas. O que já existe nesse enquadre atual. Essas medidas da OMS e de vários governos pelo planeta não são à toa. O que fazemos aqui é um trabalho do BEM, para a sociedade, para uma parte da sociedade mais necessitada, para os mais frágeis, para os nossos amados senhores senhorinhas, para aqueles que não sabemos até, e podem ter uma fragilidade imunológica.
E sobretudo, para não colapsar o sistema, pois assim muitos morrerão, de várias coisas até. E claro, fazemos para nós também. E aí entra, cuidado com alimentação, cuidar da saúde de modo geral, atenção com a violência, fazer exercícios físicos, melhorar nossa imunidade, sexo seguro ( por sinal a AIDS tem aumentado assustadoramente e ninguém mais se assusta), higiene mental, trabalhar boas “energias” ou seja, fazer o de sempre para o bem-estar de cada um, que cada um conhece melhor.
Nada nos atingirá se não tiver que ser, como qualquer outra coisa. E esse “tiver que ser” está relacionado ao organismo, imunidade, prevenção versus falta de cuidado, exposição, acidente, emocional deprimido e imunodepressão e falta de assistência. E ainda assim, muitos ainda se restabelecerão após hospitalizados. Tudo é um jogo de equilíbrio e bom senso. Fazer nossa parte, nossa obrigação e procurar sermos criativos perante esses fatos e acontecimentos.
Carl Jung, dizia as abelhas produzem mel e os homens criatividade. Então, também sejamos criativos nesse momento para minimizar seus efeitos. Não é confortável, todos pagarão um preço, aliás, já estamos pagando, contudo se faz necessário sermos mais, sermos mais fortes. O que não é ruim necessariamente. A espada samurai é forjada nas mais altas temperaturas e com várias marteladas por meses seguidos. Mas seu aço, sua resistência e sua beleza são inquestionáveis, uma vez pronta.
Fiquem bem!
Carlos Costa França
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